O
poder paralelo e a criação da XXX RA em 1988
Participei
do Decreto que criou a XXX RA da Maré, a partir do
convite feito, em 1987, pela assessoria de Coordenação
das Regiões Administrativas, dirigida por James Lewis,
para fazer parte da equipe, e ajudar pôr em prática
a proposta. Desde então, travei um diálogo
aberto com os membros da equipe: Jorge Mourão (engenheiro),
Maria Elizabeth (arquiteta) e o falecido Hermógenes,
poeta e historiador, sobre a participação
popular e as lideranças de associações
locais. Percebi que a grande dificuldade para que houvesse
eleições diretas para a escolha do primeiro
Administrador Regional era o medo do poder paralelo. Já
naquele período essa discussão ia além
da Maré, uma vez que a cidade também reivindicava
a participação popular na escolha dos Administradores
Regionais. Mas o receio era de qual poder paralelo? Lembrando:
o ex-prefeito Saturnino Braga deu voz às bases do
PDT, Partido Democrático Trabalhista, para que os
diretórios zonais, escolhessem, através do
voto direto e secreto na urna, o novo Administrador Regional.
Após
a eleição, o prefeito avaliava a lista dos
mais votados, e escolhia um nome para administrar a RA.
No entanto, com isso, o Decreto não funcionava, e
a população jamais teve a oportunidade de
escolher pelas urnas locais, uma espécie de voto
distrital, o novo Administrador (a) Regional. Sobre isso,
esbarramos numa velha tese: o prefeito foi eleito e tem
o direito de escolher quem vai ajuda-lo a governar a cidade,
já que foi aprovado em grande referendo através
do voto popular. E se houvesse eleição direta
para a escolha do Administrador Regional, com orçamento
participativo, controle social e voto distrital? Sem dúvida,
estaríamos diante de uma inovação,
o que poderia formar quadros do movimento social, e quem
sabe a representação legislativa.
A tal
reforma política que até hoje não saiu
do papel prega uma lista fechada pelos partidos políticos,
ou voto misto, uma espécie de voto intelectual, onde
determinados movimentos e pessoas possam representar a sociedade
com maior grau de comprometimento. O que vemos hoje é
o poder econômico, os filhos da burguesia preenchendo
cargos de destaque, quando o servidor público seria
a melhor pessoa para lidar com a transparência dos
recursos públicos. Assim pensou o ex-governador Carlos
Lacerda, em 1961, quando criou as Regiões Administrativas.
A diferença é que naquela época existia
o Estado da Guanabara.
O Estado
tinha orçamento próprio para solução
dos buracos nas ruas, e sobretudo prestigio político.
Haja vista que até o delegado de policia era indicado
pelo Administrador Regional. Lá e hoje ainda persiste
o velho dilema? O medo é o poder paralelo, o tráfico,
as milícias e corruptos? Há como falar de
controle político se o indicado para administrar
as RAS, em algumas vezes, pode ser a pessoa que está
comprometida com o crime? Como ficariam os partidos políticos?
Mero coadjuvante? Perderiam espaço? E os velhos coronéis
da política?
A criação
das Regiões Administrativa foi baseada na experiência
das Regiões Administrativas de Paris, onde os Administradores
Regionais são escolhidos pelo voto popular. Teríamos
condições de fazer isso hoje no Brasil? Esse
debate esta longe de terminar, na Maré, na cidade
e nos municípios do Brasil. |